Vivemos num mundo de escolhas. Em nenhuma outra altura da história, foi
cada indivíduo tão responsável pelo seu destino. Espera-se que cada um de nós
saiba o que vestir e o que comer. Espera-se que cada pessoa escolha, muito bem, o que ler,
que filme ver e que músicas ouvir. Espera-se, e aí mais importante, que cada um
saiba o que quer fazer, e com quem quer estar.
Há liberdade para isso. E isso é bom. Não queremos, não devemos, nem podemos, voltar a outros
tempos, quando as pessoas tinham de escolher e fazer aquilo que os outros
decidiam. Hoje em dia temos
acesso a experiências e produtos mais bem adaptados a qualquer um. Temos a
oportunidade de ficar mais satisfeitos com aquilo que fazemos e consumimos. Temos
um enorme controlo sobre o rumo da nossa vida. Mas, por outro lado, tantas escolhas deixam-nos paralisados. Não sabemos o
que escolher porque temos muito por onde escolher.
Será que estamos a pedir demais de cada um de nós? Dou por mim
encostado à parede pelas decisões que tenho de tomar, dando-lhes uma
importância que elas não merecem. Até escolher que filme ver na televisão pode ser um
castigo - tenho de ver todos os títulos, ler todos os resumos, e ver as suas
pontuações no IMDB. Sinto-me mal se não o faço, e se não escolho o filme
perfeito. Mas também me sinto mal porque o faço, porque o processo é desgastante.
Sinto que a responsabilidade de escolher esse filme é toda minha e, se não
escolho o melhor filme da lista, sinto que fiz um mau trabalho.
E isto repete-se
para todas as coisas da vida. Com a internet,
temos acesso a um mundo de escolhas. Podemos até escolher que carreira seguir e que
viagens fazer. A todo o momento! Somos a geração
que mais escolha tem. Mas, paradoxalmente, somos aquela que menos satisfeita fica com
as decisões que toma.
A nossa cultura deu-nos uma
responsabilidade gigante. Não o fez por mal, nós é que não estamos preparados
para tantas escolhas. Em boa verdade, nós nem sabemos porque gostamos ou não de
fazer, ou ver, ou ler, alguma coisa. Em muitos dos casos, simplesmente,
gostamos. Mas também não sabemos que não sabemos. E é esta não sabedoria que
nos leva a querer escolher. Porque pensamos que se tivermos muita escolha,
podemos escolher algo perfeito, mas só ficamos confusos.
Além disso, sinto - e creio que outros também o sentem - uma enorme pressão para fazer mais e mais, para fazer cada vez melhor, e para trabalhar muito e descansar só se for preciso. Esta pressão ninguém ma deu, ou então deram-me todos.
Vivemos no mundo do "já fizeste" e do "tens de". Já fizeste isto? Então tens de
fazer. Tens de ver esta série, tens de ver este filme, tens de experimentar
isto e tens de comer aquilo. Vivemos num mundo de escolhas, mas demasiadas escolhas. Vivemos num mundo que corre e não se deixa apanhar. Vivemos num mundo que fazer pouco é mal visto. Vivemos no mundo do "não fazes nada? grande vida".
Em tão grande corrida, não vemos aquilo
que passa diante dos nossos olhos. Não vemos o pôr do sol nem o céu estrelado.
Nem mais paramos para observar a chuva de dentro do conforto das nossas casas. Nem podemos. Porque perdemos muito tempo a escolher e
a fazer.
Não conseguimos fazer tudo, nem uma boa parte disso. A nossa força de
vontade é como uma energia que se vai gastando ao longo do dia. Escolher gasta
essa energia. E hoje temos de escolher muito.
E escolher uma carreira é, nos dias de hoje, uma das coisas mais difíceis de fazer. "Sabemos" que temos a liberdade para escolher o que quisermos. Mas essa liberdade envolve muitas escolhas, e não é raro o caso de pessoas que não sabem o que fazer na vida. Sentem-se mal se não conseguem encontrar facilmente a sua "vocação", e pensam, erradamente, que são a excepção e não a norma.
Não escrevo este texto porque sei a solução para este problema. Se eu soubesse, não teria a experiência
para escrever estas palavras. Não saberia como é ter de escolher tudo a toda a
hora, e fazer sempre mais. Não entenderia este "sofrimento", e não
perceberia o autor deste texto. Porque como se pode não querer ser o dono total
do seu destino? Escolher de entre tudo o que há para escolher. Ter o produto
perfeito, a carreira perfeita, as experiência perfeita, sempre, à nossa escolha. Não. Escrevo este artigo porque penso e volto a pensar nisto: será que a nossa geração sabe lidar com
tanta liberdade?
Não sei qual é a resposta. Talvez não devêssemos levar a vida demasiado a sério. Devíamos sim olhar para as
estrelas; para a quantidade, muito provável, de Terras que existem, e questionar a significância,
e importância, das nossas escolhas e das nossas preocupações.
Talvez seja bom confiarmos
mais nos nossos sentidos, e escolher este filme porque se gosta deste ator, ou ler
aquele livro porque se engraçou com a aquela capa.
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