A crise dos 25 anos

Um dia acordamos. Dão-nos um nome, uma casa e uma família. Levam-nos de um lado para o outro, dão-nos comida e mudam-nos a fralda. Somos completamente dependentes da nossa família. E esta faz planos em nosso nome. Os pais, os avós e os tios querem que sejamos médicos, engenheiros, artistas ou jogadores de futebol. Nós não queremos nada, porque ainda não temos consciência de quem somos e onde estamos.

Depois aprendemos a andar e a falar e, com isso, a cumprir e a pedir. Ensinam-nos o que devemos e não devemos fazer. Ensinam-nos quem respeitar, o que comer, o que vestir e o que pensar. E nos primeiros anos de escola aprendemos os básicos para a (longínqua) vida futura.

Ficamos mais velhos e queremos ser os putos fixes da escola. E é durante a adolescência que definimos grande parte da nossa personalidade. Agora aprendemos o que gostamos e não gostamos de fazer. Começamos a surfar, a tocar guitarra e a descobrir o mundo à nossa volta. Mais do que tudo, imitamos. Ouvimos o que outros ouvem, vestimos o que os outros vestem, pensamos, por contágio, o que os outros pensam.

Por outro lado, a família, os professores e a sociedade em geral, dizem-nos o que devemos fazer – tirar boas notas e entrar num bom curso, numa boa faculdade. Porque assim vamos ter um emprego estável e duradouro, vamos puder passar férias onde queremos, comprar o carro que desejamos e ter uma casa de sonho. Dizem-nos que a vida é séria, e não há como brincar com ela. Dizem-nos que temos de trabalhar muito, casar e ter filhos. Esse é o sonho. No final da carreira, e depois de 40 anos a trabalhar, como prémio, temos a reforma. Aí vamos puder fazer o que queremos, e cuidar dos netos e viajar o tempo todo. Esta filosofia de vida é-nos incutida. E nós acreditamos, porque não sabemos melhor. Eles são adultos, eles sabem do que falam, e eles parecem estar bem na vida.

Depois temos de decidir o que queremos fazer da vida. E há quem saiba, desde sempre, o que quer fazer "quando for grande". Para estes a decisão é fácil, e já sabem o curso que querem tirar, ou já sabem que não querem tirar um curso e têm outros planos. Os que sempre tiraram boas notas, mesmo estando indecisos, sabem que têm de ir para a faculdade. Para estes, escolher o curso é a decisão mais difícil das suas vidas. E os que não têm boas notas também são "empurrados" para a faculdade. Aliás, é assim que "tem" de ser. Quem estuda muito tem à espera um bom emprego e pode comprar uma série de coisas boas - foi isso que nos contaram.

Vamos para a faculdade. Saímos das casas dos pais e somos "independentes" pela primeira vez na vida. Fazemos aquilo que é suposto fazer – estudar muito e tirar boas notas. Além disso, festejamos a boa vida de faculdade. Conhecemos muitas pessoas, todas diferentes, todas iguais. É uma altura boa, que, como nos avisaram, passa depressa. No final estamos ansiosos por conhecer o mercado de trabalho. Finalmente, vamos ter o nosso dinheiro e vamos puder comprar o que queremos. Vamos viver o sonho, neste caso, português.

No primeiro mês de trabalho tudo é uma novidade. Usamos termos como CEO e Business Plan. Temos fatos todos bonitos, sentimo-nos importantes e somos o orgulho da nossa família. Mas esta sensação não dura muito tempo. Passada a novidade, percebemos que temos um emprego chato, que trabalhamos muitas horas e que recebemos pouco. Os nossos chefes parecem cansados. E saímos da faculdade com a cabeça cheia de ideias inovadoras, prontos para as testar nestas empresas, e "elas" dizem-nos que somos muito novos, que estamos aqui é para cumprir, que temos muito para provar até pudermos fazer alguma coisa. Ouvimos pela primeira vez a frase “não te queixes...no meu tempo…”, e sabemos que a partir daí está tudo estragado.

O trabalho é cada vez mais chato. Pensamos que é um problema local e que está na altura de mudar de emprego. Assim fazemos e encontramos a mesma situação noutro local. Ficamos brutalmente desmotivados. Mais do que nunca, somos possuídos pelo síndrome do domingo à tarde, aquele que nos deixa mal-dispostos por saber que amanhã é dia de trabalho. 

Num ato de salvação mental, despedimo-nos, tento a certeza (fraquinha) que iremos encontrar qualquer coisa para fazer. Mas a crise dos 25 anos mal está a começar.

Sentimos que tudo aquilo que nos foi dito estava errado. Onde está o emprego que nos foi prometido? Nós, que estudámos tanto. Que outras mentiras nos disseram? Será que queremos uma grande casa e um bom carro? E ter filhos? Quem é quem para nos dizer o que temos de fazer? Para quê matar-me a trabalhar para, ao final de 40 anos, reformar-me, agora sem paciência para gastar o dinheiro que juntei? Qual é o sentido da (minha) vida? Qual é a chave para a felicidade? Qual é o meu destino?

As perguntas são muitas, e as respostas não se fazem acompanhar. Pensamos o dia todo sobre elas. E começamos a ler sobre tudo isto. Lemos sobre psicologia e produtividade e filosofia e estilos de vida. Conhecemos, através dos livros, pessoas que ousaram ser diferentes e que estão muito bem na vida. Aprendemos mais sobre nós, sobre o que gostamos e o que gostaríamos de fazer, e alteramos as nossas prioridades. A pouco e pouco, vamos aprendendo uma nova filosofia de vida.

Aprendemos que somos generalistas e aprendemos a respeitar a nossa personalidade. Começamos um blog, viajamos pela Europa, começamos a meditar testamo-nos de muitas formas. Com a cabeça mais leve e com a vontade mais clara, começamos a tomar decisões importantes e a definir o rumo da nossa vida. Ou, pelo menos, foi isso que eu fiz.

Todos (acho) passamos pela crise dos 25 anos. Isso acontece quando descobrimos que a filosofia de outros tempos, e que nos foi ensinada, está desatualizada. Que empregos bons podem haver, mas não os vamos descobrir à primeira ou segunda tentativa com nos fizeram crer. E, certamente, estudar não garante trabalho.

É importante passarmos pela crise dos 25 anos - termos a coragem de rejeitar um trabalho e uma vida que não nos satisfazem. Porque, de outra maneira, adiamos a crise para os 30, 35 ou 40 anos. E nessa altura a mudança é mais difícil e radical. É importante dar o passo que ainda acreditamos ser para trás.

Precisamos de ler muito para percebermos mais sobre tudo. Precisamos de definir as nossas prioridades e atualizar a nossa filosofia de vida. Com isso, é certo, que o passo atrás irá dar balanço para dois ou três passos para a frente. Por fim, e pela segunda vez na vida, "acordamos".

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