Um dia acordamos. Dão-nos um nome, uma casa e uma família.
Levam-nos de um lado para o outro, dão-nos comida e mudam-nos a fralda. Somos
completamente dependentes da nossa família. E esta faz planos em nosso nome. Os
pais, os avós e os tios querem que sejamos médicos, engenheiros, artistas ou
jogadores de futebol. Nós não queremos nada, porque ainda não temos consciência
de quem somos e onde estamos.
Depois aprendemos a andar e a falar e, com isso, a cumprir e
a pedir. Ensinam-nos o
que devemos e não devemos fazer. Ensinam-nos quem respeitar, o que comer, o que
vestir e o que pensar. E nos primeiros anos de escola aprendemos os básicos
para a (longínqua) vida futura.
Ficamos mais velhos e queremos ser os putos fixes da escola.
E é durante a adolescência que definimos grande parte da nossa personalidade. Agora
aprendemos o que gostamos e não gostamos de fazer. Começamos a surfar, a tocar guitarra e a descobrir o mundo à nossa volta. Mais do que tudo, imitamos.
Ouvimos o que outros ouvem, vestimos o que os outros vestem, pensamos, por contágio,
o que os outros pensam.
Por outro lado, a família, os professores e a sociedade em geral, dizem-nos
o que devemos fazer – tirar boas notas e entrar num bom curso, numa boa
faculdade. Porque assim vamos ter um emprego estável e duradouro, vamos puder
passar férias onde queremos, comprar o carro que desejamos e ter uma casa de
sonho. Dizem-nos que a vida é séria, e não há como brincar com ela. Dizem-nos
que temos de trabalhar muito, casar e ter filhos. Esse é o sonho. No final
da carreira, e depois de 40 anos a trabalhar, como prémio, temos a reforma. Aí
vamos puder fazer o que queremos, e cuidar dos netos e viajar o tempo todo. Esta filosofia de vida é-nos incutida. E
nós acreditamos, porque não sabemos melhor. Eles são adultos, eles sabem do que
falam, e eles parecem estar bem na vida.
Depois temos de decidir o que queremos fazer da vida. E há quem saiba, desde sempre, o que quer fazer "quando for grande". Para estes a decisão é fácil, e já sabem o curso que
querem tirar, ou já sabem que não querem tirar um curso e têm outros planos. Os
que sempre tiraram boas notas, mesmo estando indecisos, sabem que têm de ir para a
faculdade. Para estes, escolher o curso é a decisão mais difícil
das suas vidas. E os que não têm boas notas também são "empurrados" para
a faculdade. Aliás, é assim que "tem" de ser. Quem estuda muito tem à espera
um bom emprego e pode comprar uma série de coisas boas - foi isso que nos contaram.
Vamos para a faculdade. Saímos das casas dos pais e somos
"independentes" pela primeira vez na vida. Fazemos aquilo que é suposto
fazer – estudar muito e tirar boas notas. Além disso, festejamos a boa vida de faculdade.
Conhecemos muitas pessoas, todas diferentes, todas iguais. É uma altura boa,
que, como nos avisaram, passa depressa. No final estamos ansiosos por conhecer
o mercado de trabalho. Finalmente, vamos ter o nosso dinheiro e vamos puder
comprar o que queremos. Vamos viver o sonho, neste caso, português.
No primeiro mês de trabalho tudo é uma novidade. Usamos
termos como CEO e Business Plan. Temos fatos todos bonitos, sentimo-nos
importantes e somos o orgulho da nossa família. Mas esta sensação não dura
muito tempo. Passada a novidade, percebemos que temos um emprego chato, que
trabalhamos muitas horas e que recebemos pouco. Os nossos chefes parecem
cansados. E saímos da faculdade com a cabeça cheia de ideias inovadoras, prontos para as testar nestas
empresas, e "elas" dizem-nos que somos muito novos, que estamos aqui é para
cumprir, que temos muito para provar até pudermos fazer alguma coisa. Ouvimos
pela primeira vez a frase “não te queixes...no meu tempo…”, e sabemos que a
partir daí está tudo estragado.
O trabalho é cada vez mais chato. Pensamos que é um problema
local e que está na altura de mudar de emprego. Assim fazemos e encontramos a mesma
situação noutro local. Ficamos brutalmente desmotivados. Mais do que nunca, somos possuídos pelo síndrome do domingo à tarde, aquele que nos deixa mal-dispostos por saber que amanhã é dia de trabalho.
Num ato de salvação mental, despedimo-nos,
tento a certeza (fraquinha) que iremos encontrar qualquer coisa para fazer.
Mas a crise dos 25 anos mal está a começar.
Sentimos que tudo aquilo que nos foi dito estava errado.
Onde está o emprego que nos foi prometido? Nós, que estudámos tanto. Que outras
mentiras nos disseram? Será que queremos uma grande casa e um bom carro? E ter
filhos? Quem é quem para nos dizer o que temos de fazer? Para quê
matar-me a trabalhar para, ao final de 40 anos, reformar-me, agora sem
paciência para gastar o dinheiro que juntei? Qual é o sentido da (minha) vida? Qual é a chave para a felicidade? Qual é o meu destino?
As perguntas são muitas, e as respostas não se fazem
acompanhar. Pensamos o dia todo sobre elas. E começamos a ler sobre tudo isto.
Lemos sobre psicologia e produtividade e filosofia e estilos de vida. Conhecemos,
através dos livros, pessoas que ousaram ser diferentes e que estão muito
bem na vida. Aprendemos mais sobre nós, sobre o que gostamos e o que gostaríamos de fazer, e alteramos
as nossas prioridades. A pouco e pouco, vamos aprendendo uma nova filosofia de vida.
Todos (acho) passamos pela crise dos 25 anos. Isso acontece quando descobrimos que a filosofia de outros tempos, e que nos foi ensinada, está desatualizada. Que empregos bons podem haver, mas não os vamos descobrir à primeira ou segunda tentativa com nos fizeram crer. E, certamente, estudar não garante trabalho.
É importante passarmos pela crise dos 25 anos - termos a coragem de rejeitar um trabalho e uma vida que não nos satisfazem. Porque, de outra maneira, adiamos a crise para os 30, 35 ou 40 anos. E nessa altura a mudança é mais difícil e radical. É importante dar o passo que ainda acreditamos ser para trás.
Precisamos de ler muito para percebermos mais sobre tudo. Precisamos de definir as nossas prioridades e atualizar a nossa filosofia de vida. Com isso, é certo, que o passo atrás irá dar balanço para dois ou três passos para a frente. Por fim, e pela segunda vez na vida, "acordamos".
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